Herança para cônjuge e filhos é diferente nos casos de casamento e união estável?
Dando continuidade ao artigo publicado no nosso blog sobre a partilha de bens no divórcio em regime da comunhão parcial de bens (leia aqui), explicaremos como se dá a sucessão do cônjuge que vive sob esse regime, nos casos de casamento e união estável.
Dúvidas frequentes:
• Qual parte da herança cabe ao cônjuge sobrevivente (no caso de casamento)?
• E ao companheiro (quando o casal vive em união estável)?
• E quando há filhos comuns do casal, exclusivos do(a) falecido(a) ou, ainda, filiação híbrida (filhos comuns do casal e exclusivos de um deles)?
• Qual fração da herança cabe a cada um?
•
União estável e casamento: existe diferença?
Na sucessão não há mais qualquer distinção legal entre a família formada pela união estável ou pelo casamento. Em ambos os casos, as seguintes pessoas serão chamadas para suceder na sequência prevista no artigo 1829, I, do Código Civil:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
Bens comuns e bens particulares na comunhão parcial de bens
Conforme comentamos no artigo anterior, se na união estável não foi formalizado contrato optando por outro regime de bens, será aplicada a regra geral da comunhão parcial. Vale, também para bens excluídos da comunhão e partilha de bens em caso de divórcio.
Como se dá a partilha de bens na sucessão pela comunhão parcial de bens? Qual parte da herança cabe ao cônjuge/companheiro?
O cônjuge/companheiro, como meeiro, ou seja, como titular da metade do patrimônio construído ao longo da relação a dois, terá direito à meação dos bens comuns. Tem direito, portanto, à metade de todos os bens adquiridos onerosamente na constância do casamento/união estável. Dessa forma, não se fala em herança de tais bens comuns, uma vez que, metade do patrimônio comum já é de propriedade do cônjuge sobrevivente.
Já a outra metade dos bens comuns é considerada herança, que caberá aos demais herdeiros necessários[1].
Bens particulares, se houver, diferente do que ocorre no divórcio, são também transmitidos ao cônjuge/companheiro como herança, estando a concorrência do cônjuge/companheiro com os herdeiros limitada a essa natureza de bens, na ordem indicada acima em razão do artigo 1829, I, do CC.
Vale lembrar que na comunhão parcial de bens são considerados bens particulares o que cada cônjuge/companheiro possuía antes do casamento/união estável, os que lhe sobrevieram, durante o matrimônio, por doação ou sucessão e os que forem substituídos em seu lugar.
É interessante notar que no regime de separação total (consensual), todos os bens são considerados particulares, logo o cônjuge/companheiro também concorre com os descendentes, conforme a regra geral aqui mencionada para a comunhão parcial.
Qual fração da herança caberá aos filhos comuns, exclusivos do falecido ou existindo filiação híbrida?
É fundamental a diferenciação dos filhos comuns e filhos exclusivos do falecido para definir a divisão dos bens na concorrência do cônjuge com os descendentes.
O artigo 1.832 do Código Civil estabelece:
Art. 1.832. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.
Porém, após muita discussão sobre essa previsão legal nos Tribunais, atualmente predomina o seguinte entendimento:
Somente será assegurada a reserva da quota mínima de 1/4 da herança dos bens particulares do falecido ao cônjuge sobrevivente quando este concorrer apenas com os filhos comuns do casal.
Por outro lado, não haverá reserva de 1/4 em duas situações:
1ª) quando os descendentes forem exclusivos do autor da herança, ou
2ª) no caso de filiação híbrida (há descendentes comuns do casal e exclusivos do falecido)
Para melhor compreensão das regras, vamos a um caso prático:
Um casal celebrou matrimônio no regime da comunhão parcial de bens. Antes do casamento, o marido já tinha adquirido um imóvel e tinha dois filhos exclusivos. O casal teve um filho e, tempos depois, o marido faleceu.
De acordo com explicação acima, o imóvel anterior ao casamento é um bem particular que na hipótese de divórcio, não deve ser partilhado com a ex-esposa.
Porém, em caso de falecimento, os bens particulares seguem regra diferente!
Então, a cônjuge/companheira sobrevivente, na qualidade de meeira, tem direito à metade (meação) dos bens comuns (adquiridos onerosamente na constância do casamento). A outra metade dos bens comuns será partilhada somente entre os filhos.
E quanto aos bens particulares?
Estamos diante de um caso de filiação híbrida (filhos de outro relacionamento e filhos comuns), logo, a cônjuge sobrevivente concorrerá com os descendentes na mesma proporção, sendo cabível 1/4 para ela e 1/4 para cada filho dos três que ele deixou.
O mesmo se dará no caso de união estável pela comunhão parcial de bens.
Recomendação
Nesse artigo esclarecemos apenas a regra geral, entretanto, pela lei brasileira, a sucessão tem muitas peculiaridades, podendo dar margem para diversas discussões jurídicas.
Sendo assim, recomendamos consultar um advogado especialista em planejamento sucessório que possa atender suas expectativas, considerando as diversas hipóteses de comunicabilidade ou não de bens, conforme o regime adotado, assim como, a possibilidade de doação ou testamento da parte disponível do patrimônio com ou sem cláusulas restritivas (impondo impenhorabilidade, incomunicabilidade ou inalienabilidade).
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[1] São os descendentes, os ascendentes e o cônjuge/companheiro.
Fonte: Publicado por Camila Felicissimo Soares em 12 de novembro de 2020
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